Criada através da Resolução n. 23/2018, que dispõe sobre a estrutura e o funcionamento do Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos, a Coordenadoria de Justiça Restaurativa (CJR), a partir de deliberação dos membros do NUPEMEC em maio de 2021, passou a incorporar as atribuições de macrogestão da justiça restaurativa no âmbito do Poder Judiciário estadual com o objetivo de “desenvolver plano de difusão, divulgação, expansão, implementação e acompanhamento do Programa de Justiça Restaurativa” do TJPA.
Os projetos e iniciativas no campo da justiça restaurativa desenvolvidos no Estado do Pará entre 2011 e 2019, assim como as orientações da Política Judiciária Nacional para o setor, revelaram os desafios para a implantação, implementação, expansão, qualificação e sustentabilidade de sistemas restaurativos, que incluem: constituição de infraestrutura adequada (espaço físico, materiais e quadro de pessoal); articulação com outros Poderes, atores sociais, instituições públicas e privadas, organizações não governamentais e entidades da sociedade civil; atuação em rede, interdisciplinar, interinstitucional e intersetorial; acessibilidade ao público-alvo, profissionais e potenciais usuários do sistema; construção de canais de divulgação dos serviços restaurativos; e, ainda, formação, supervisão e suporte técnico a facilitadores, multiplicadores/instrutores e demais atores que trabalham com justiça restaurativa.
Com o objetivo de atender estas condições de viabilidade da justiça restaurativa, a Coordenadoria de Justiça Restaurativa apresentou o Plano de Ações intitulado “Justiça Restaurativa: Construindo Paz e Bem Viver”. Ele traz implícita uma compreensão da justiça restaurativa como estratégia voltada à construção sustentável da paz, o que implica não apenas a prevenção e o enfrentamento de violências diretas e conflitos intersubjetivos, senão também a transformação de fatores estruturais, institucionais, culturais e históricos que contribuem para a produção e reprodução de violações a pessoas e relacionamentos, assim como ao ambiente e os seres que nele habitam. Neste sentido, a abordagem restaurativa caminha ao lado de esforços pela concretização da justiça social e ambiental, considerando temas como as relações étnico-raciais, interculturais, entre gêneros, classes, gerações e grupos com visões diferentes quanto à interação humanidade/natureza. Por isso, dialoga com noções como equidade, bem-estar individual e coletivo, qualidade de vida e bem viver – esta última presente nas culturas ameríndias, remetendo a uma concepção de vida harmônica entre os seres humanos, o mundo natural e os demais entes que o integram.
Nesta linha de entendimento, a justiça restaurativa se apresenta como uma estratégia disponível ao Poder Judiciário brasileiro para a realização dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), recomendados pela Agenda 2030 da ONU, cujo Objetivo 16 indica: “Paz, justiça e instituições eficazes –
Promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis”.
Enquanto forma de imaginar, praticar e vivenciar a justiça, as metodologias restaurativas se caracterizam pela inclusão de todos os afetados por uma dada situação de conflito que envolve danos, configurada ou não como crime ou ato infracional, com foco sobretudo no atendimento de necessidades e direitos humanos, na prevenção e transformação dos padrões de violência (em suas expressões direta, estrutural, institucional, cultural e histórica), assim como na reparação dos danos e na restauração do tecido social rompido em razão de uma ofensa. Esta abordagem apresenta potencial para favorecer processos dialógicos e emancipatórios no tratamento de situações conflitivas através do uso de tecnologias sociais que visam à responsabilização dos autores de atos danosos, à atenção aos traumas sofridos pelas vítimas e ao empoderamento de famílias e comunidades, reparando e fortalecendo os vínculos sociais violados em decorrência do conflito e dos danos que provocara aos atores envolvidos.
É esta a compreensão da justiça restaurativa subjacente às ações previstas no Plano e que são balizes para o trabalho da Coordenadoria de Justiça Restaurativa.
A fim de atender a Política Nacional de Justiça Restaurativa prevista na Resolução n. 225/2016 do CNJ, a Estratégia Nacional do Poder Judiciário 2021-2026, e considerando uma visão expandida de justiça restaurativa, o Plano de Ações “Justiça Restaurativa: Construindo Paz e Bem Viver” considera 12 (doze) eixos em que o Tribunal de Justiça do Pará poderá atuar, quais sejam:
1. Justiça restaurativa na defesa, proteção e promoção de direitos de crianças e adolescentes.
2. Justiça restaurativa na prevenção e enfrentamento da violência doméstica, familiar e de gênero.
3. Justiça restaurativa no sistema de justiça criminal e de execuções penais.
4. Justiça restaurativa e atenção às vítimas de crimes, atos infracionais e outros eventos traumagênicos.
5. Justiça restaurativa nos Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania.
6. Justiça restaurativa no tratamento de conflitos fundiários, agrários e socioambientais.
7. Justiça restaurativa no tratamento de conflitos que envolvem relações étnico-raciais e interculturais.
8. Formação e supervisão de facilitadores e multiplicadores/instrutores de justiça restaurativa.
9. Sensibilização e disseminação social da justiça restaurativa.
10. Comunicação não violenta, saúde e qualidade de vida no ambiente de trabalho e organizacional do TJPA.
11. Justiça restaurativa, atuação em rede e parcerias interinstitucionais.
12. Governança compartilhada, inclusiva e colaborativa da justiça restaurativa.