Presidente do STF e CNJ, ministra Rosa Weber, exaltou iniciativa inédita que trata da preservação
A 1ª Cúpula Judicial Ambiental da Amazônia – Juízes e Florestas teve início nesta sexta-feira, 4, no Auditório Desa. Maria Lúcia Marcos dos Santos, localizado no Anexo I, ao prédio-sede do Tribunal de Justiça do Pará (TJPA). Promovido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o evento busca promover o debate sobre temas relacionados à atuação judicial ambiental na Amazônia e conta com a participação de autoridades do Judiciário, do Executivo Federal, além de especialistas. A cúpula terá continuidade no sábado, 5, de 9 às 19h.
Temas ambientais e climáticos, a jurisprudência brasileira sobre florestas e desmatamento e propostas de aperfeiçoamento da prestação jurisdicional estão entres as questões de maior relevância e urgência discutidas no evento. A iniciativa também vai traçar um panorama da atuação judicial em outros países da Pan-Amazônia e apresentar uma radiografia do desmatamento na região, entre outros assuntos.
Na abertura solene do evento, a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do CNJ, ministra Rosa Weber, destacou o ineditismo da cúpula e o engajamento do Judiciário na discussão das questões debatidas, especialmente as climáticas e relacionadas ao contexto da Amazônia.
O cenário de impactos ambientais, como a aceleração do aquecimento global e a emissão de toneladas de dióxido de carbono na atmosfera, segundo ela, foram mudanças que colocaram a região amazônica no protagonismo do debate ambiental. “Dúvida não há quanto ao quadro de emergência e a gravidade das mudanças climáticas vivenciadas, que colocam a Amazônia no núcleo do debate sociopolítico ambiental tanto na perspectiva nacional quanto na internacional”, disse a ministra.
A magistrada acrescentou que a região amazônica contém mais de 60% das florestas tropicais, 20% da água doce e 10% da biodiversidade mundiais e consiste num dos principais ativos do Brasil na geopolítica internacional, por conta de sua biodiversidade, que influencia diretamente o ciclo de carbono, importante nas mudanças climáticas globais.
Os fenômenos da degradação ambiental vivenciados localmente sob forma do desmatamento e das queimadas, que apresentam níveis crescentes na região e cujas escaladas não têm sido contidas efetivamente pelos esforços governamentais têm repercussão em todo o planeta segundo a ministra, fazendo com que a região corra o risco de perder a capacidade de absorção do dióxido de carbono (CO2), e contribuindo para sua emissão em quantidade preocupante.
Para Rosa Weber, a realização dos direitos fundamentais também requer qualidade socioambiental. A ministra mencionou ainda o Acordo Regional sobre Acesso à Informação, Participação Pública e Acesso à Justiça em Assuntos Ambientais na América Latina e no Caribe, celebrado em Escazú, na Costa Rica em 2018, cuja incorporação ao sistema normativo brasileiro está em trâmite no Congresso Nacional.
A presidente do Tribunal de Justiça do Pará (TJPA), desembargadora Maria da Nazaré Silva Gouveia dos Santos enfatizou o papel da Amazônia como uma das regiões mais vitais do planeta, desempenhando papel fundamental na regulação do clima global, na biodiversidade e na preservação do meio ambiente e que enfrenta diversos desafios ambientais. “Por esses motivos um evento como a Cúpula Judicial Ambiental da Amazônia, que visa debater temas relacionados a essas atuações judiciais, é de extrema relevância, a fim de que se possa desenvolver relevantes ações voltadas à promoção de questões relacionadas ao meio ambiente”, disse.
A magistrada disse sentir-se esperançosa que a realização da Cúpula Judicial Ambiental atenda aos anseios regionais e ambientais, prenunciando a Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP-30), em que problemas e soluções estarão no centro dos debates das questões ambientais.
A Presidente da Fundação Nacional dos Povos indígenas (FUNAI), Joenia Wapichana enfatizou que o momento é importante para trazer aliança e reflexão à discussão da crise climática e implementar compromissos, lembrando ainda da importância do papel das populações locais e povos originários na conservação ambiental, bem como da importância da sua inclusão em políticas públicas.
O governador do estado do Pará, Helder Barbalho, destacou a junção de esforços para que o Estado discuta e elabore ações para a construção de políticas públicas na área ambiental.
A Ministra Rosa Weber entregou aos (às) integrantes da Mesa solene exemplares da primeira tradução da constituição Federal para o idioma indígena nheengatu.
Conferências
“Políticas Públicas e Florestas” foram temas discutidos na primeira conferência da cúpula, presidida pelo ministro Luiz Philippe Vieira de Melo Filho. O ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, teceu considerações sobre a região. A Amazônia, para ele, deve ser pensada no plural, como um santuário florestal que também abriga metrópoles. Não há um único modelo de enfrentamento de problemas para a pluralidade de Amazônias, que sofrem com desigualdades sociais e onde deve haver atuação na aplicação da lei em seu enfrentamento, com garantia de trabalho e emprego ao povo da Amazônia, não apenas na produção de produtos primários.
Entre as ações adotadas pelo governo federal para o combate a crimes ambientais está a mobilização de cerca de 2 bilhões para Centros de Comando e Controle na Amazônia, localizados em Manaus. Com isso, a expectativa é aproximar as forças de segurança dos vazios territoriais da região. Além disso, há a pretensão da criação de centro de cooperação policial dos países da Amazônia, também em Manaus. Ambas iniciativas possuem a finalidade de ampliar a presença do governo federal na Amazônia.
A ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva explicou que está em desenvolvimento o Plano da Transição Ecológica brasileira, no qual há espaço para o agronegócio, para o extrativismo, para a bioeconomia e para que ocorram atravessamentos entre a ciência baseada em postulados e o saber dos povos originários.
A ministra disse ainda que o Governo Federal desenvolve políticas públicas com base em evidência, dados do INPI. Foram feitos levantamentos que constataram que houve aumento de 173% nos autos de infração pelo IBAMA, 107% de apreensões e 254% da destruição de equipamentos por meio de ações de comando e controle. A ministra frisou que a lei não se sustenta sozinha, deve haver aderência com a sociedade, estrutura políticas e econômicas sociais e culturais, por isso busca-se mudar o modelo de desenvolvimento em todas as suas dimensões.
Conferência 2
O segundo debate do dia versou sobre a atuação judicial na questão ambiental, presidido pelo ministro Antônio Herman Benjamin, do Superior Tribunal de Justiça (STJ). A ministra e ex-Presidente do STF Cármen Lúcia Antunes fez um panorama teórico sobre as competências do Judiciário no Direito Constitucional ecológico. Para isso, contextualizou temporalmente a preocupação ambiental, iniciada nos anos 60 por conta da poluição, que resultou na conferência de Estocolmo. O encontro fez com que o mundo se voltasse à questão, que demandava cuidado com o meio ambiente. A partir de 1973 o Brasil criou órgãos especializados em meio ambiente, mas havia um desagrado com o país como grande poluidor.
A Constituição Federal contempla o meio ambiente em seu artigo 225, mas não se restringe a ele, segundo a ministra. Hoje há um sistema constitucional que inclui a questão ambiental como direito fundamental. A Constituição Federal de 88 propõe princípios constitucionais ambientais, que devem ser levados em consideração por magistrados.
A ministra explicou o conceito de Estado constitucional ecológico, que traz um humanismo muito mais extenso, levando em consideração a perspectiva de solidariedade ambiental. No âmbito do Judiciário, os julgamentos devem aplicar esse entendimento.
No Direito ambiental, há defasagem entre norma e aplicação. Para a ministra deve haver compromisso de juízes com política públicas, as leis ambientais devem ser aplicadas e cumpridas com rigor, além de um sentimento constitucional cultivado na sociedade, uma cultura ambiental ser sedimentada na sociedade. A importância da necessidade de orçamentos em matéria ambiental também foi lembrada pela ministra.
A ministra Cármen Lúcia fez algumas proposições para que o Judiciário avance na questão ambiental. Sugeriu que o CNJ crie coordenadorias de ambiente e clima, que juízes e juízas tenham apoio com conhecimentos; destacou a atuação de Promotorias do meio ambiente e a manutenção de formação de magistrados para exercer jurisdição com acesso a esses dados; a criação de grupos reflexivos em matéria ambiental para impedir reincidência e a inclusão do Direito ambiental e climático como disciplina obrigatória na faculdade de Direito.
O vice-presidente do STF, Ministro Luís Roberto Barroso afirmou que a proteção ambiental no Brasil é um Tema constitucional por meio do artigo 225, que demanda um meio ambiente ecologicamente equilibrado, o que imprime uma marca no Judiciário brasileiro diferente de outros países. O ministro disse ainda que o Brasil deve assumir liderança ambiental global.
Barroso apontou como causas do aumento para o desmatamento o relaxamento de medidas de controle e a permanente possibilidade de legalização da grilagem. Segundo ele, também é imperativo que se crie bioeconomia da floresta e fomento, já que os últimos 50 anos de desmatamento não implicaram aumento de indicadores sociais, e que se agregue valor ao produto da floresta por meio de tecnologia.
O ministro mencionou alguns casos que exemplificam intervenção judicial nessas matérias, já que muitas vezes somente o Judiciário pede proteger direitos fundamentais, inclusive relativos ao meio ambiente, como a condenação do Poder público na Holanda a tomar medidas para reduzir emissões de carbono e na Alemanha a lei de proteção do clima foi declarada inconstitucional porque só previa medidas até 2030 com base no princípio intergerações.
Presidente do TJPA conduz debate sobre desmatamento
A presidente do TJPA, desembargadora Maria de Nazaré Silva Gouveia dos Santos conduziu os debates da Mesa Redonda Radiografia do Desmatamento na Amazônia. O Professor e Diretor do Departamento de Políticas de Controle do Desmatamento e Queimadas, Ministério do Meio Ambiente e Mudanças Climáticas Raoni Rajão enumerou problemas no combate à degradação ambiental na Amazônia legal, destacou o papel essencial das áreas protegidas para proteção ambiental e citou áreas chave de cooperação para avançar no combate ao desmatamento.
A pesquisadora associada do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (IIMAZON), Brenda Brito Brenda apresentou pesquisa sobre a Atuação do judiciário e seus resultados. Ingressaram 3.500 ações judiciais por meio de programa do MPF Amazônia Protege, a maioria foi extinta e 145 julgadas procedentes, com recuperação da área degradada em 100% delas e gerando 15 TACs. A pesquisadora destacou pontos a serem resolvidos e fez Recomendações ao CNJ e MP e juízes.
A consultora do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (Unodc) no Brasil Leslie Ferraz apresentou mais um estudo sobre o Papel da justiça na resposta a crimes florestais, iniciado em 2021, que se propõe a fazer análise o papel do Judiciário na governança ambiental e apresentou resultados de evolução temporal, com tendência ao crescimento. Predominam as ações criminais e o tempo médio de julgamento é de 4 anos em média, em 1ª instância e finalizou com achados preliminares.
Pan-Amazônia
Apesar de 60% da Amazônia localizar-se em território brasileiro, a floresta se estende por outros oito países: Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Guiana Francesa, Peru, Suriname e Venezuela. Diante dessa realidade e da relevância de diálogo com atores do Sistema de Justiça e da academia, participam da cúpula presidentes de Cortes Constitucionais e Supremas de países da Pan-Amazônica, além de outros atores internacionais. São eles: a presidente da Corte Constitucional, Diana Rivera; do presidente da Corte Suprema de Justiça, Fernando Cadena, ambos da Colômbia; do presidente da Corte Constitucional do Equador, Alí Prado; do presidente do Tribunal Constitucional do Peru, Francisco Saravia; e da juíza representante da Corte Suprema de Justiça da República do Peru, Marruja Castro.
Participaram magistrados e magistradas de países que abrangem a Amazônia lega: Da Colômbia Armando Castillo Cadena, presidente da Corte suprema de Justicia, magistrada Diana Fajardo Rivera, presidente da Corte Constitucional da Colômbia; do Equador juiz constitucional Alí Lozada Prado, presidente da Corte Constitucional; do Peru o magistrado Francisco Morales Saravia , presidente do Tribunal constitucional e a juíza Marruja Otilia Hermosa Castro, da Corte Suprema de justiça
O evento prossegue no sábado, 5, de 9h às 19h. confira a programação aqui.