Familiares e amigos da vítima acompanharam até o fim da sessão
Por maioria dos votos, os jurados do 2º Tribunal do Júri de Belém, sob a presidência da juíza Ângela Alice Alves Tuma, votaram pela condenação do pecuarista Décio José Barroso Nunes, reconhecendo a responsabilidade criminal do acusado de ser mandante do assassinato do sindicalista José Dutra da Costa, o Dezinho.
A pena imposta ao condenado de 12 anos de reclusão será cumprida em regime inicial fechado. Na sentença condenatória foi concedido o direito do réu de recorrer em liberdade, considerando o fato do réu ter respondido ao processo nessa condição e ter comparecido à Justiça em todos os atos do processo.
A decisão acolheu por maioria dos votos a acusação sustentada pelo promotor Franklin Prado em conjunto com os advogados Marco Apolo Santana Leão e Antônio Alberto Pimentel, habilitados como assistentes de acusação.
A defesa do fazendeiro, promovida pelo advogado Antônio Maria Freitas Leite Júnior, sustentou a tese de negativa de autoria de participação em homicídio qualificado, mediante promessa de recompensa, sendo rejeitada por maioria dos jurados.
A sentença foi proferida às 16h26, após dois dias de julgamento, aberto terça-feira, 13, às 08h30, no Fórum Criminal de Belém. O júri, como todos realizados em Belém, foi transmitido online. Presentes no plenário familiares e amigos da vítima, que vieram de Rondon do Pará, a mais de 500 quilômetros de Belém.
Compareceram à sessão representantes da Sociedade de Defesa dos Direitos Humanos (SDDH); representantes da Central dos Trabalhadores, CUT; Federação dos Trabalhadores em Agricultura, FETAGRI; Sindicatos; Pastorais Sociais da Igreja Católica; a deputada estadual Marinor Brito (PSOL).
“Achamos justa a condenação e não esperávamos outra decisão com todas as provas, desse bárbaro crime. O sentimento da família é de que nosso pai foi honrado com a decisão”, desabafou Joelida, uma das quatro filhas da vítima.
Os trabalhos do júri
A sessão começou com depoimentos das testemunhas, três delas da acusação, sendo uma dispensada. Pela defesa, compareceram três, e uma delas também dispensada pela defesa. O segundo dia foi reservado para os debates das teses da acusação e da defesa. As investigações chegaram ao nome de Décio José, por este liderar um grupo de fazendeiros para custear pistoleiros para matar quem estivesse incomodando.
O sindicalista se tornou alvo do grupo após acompanhar, enquanto líder sindical, a ocupação da fazenda Tulipa Negra e denunciar às autoridades ameaças de morte por sua luta em defesa dos direitos dos trabalhadores rurais de Rondon. Dezinho também atraiu a ira desse grupo ao denunciar o comercio ilegal de madeira e derrubada de arvores, entre outros crimes ambientais e trabalhistas.
O delegado Valdir Rezende, que atuou nas investigações, relatou como chegou aos nomes de fazendeiros e intermediários do crime, após 15 dias da morte do sindicalista, quando teve acesso a material entregue por Francisco Martins da Silva Filho, um dos assentados da Fazenda Tulipa Negra. Francisco e um irmão dele, Pedro, trabalharam como cobrador de Delsão. Após o irmão de Francisco ser assassinado, ele teve acesso às fitas em que Pedro costumava gravar conversas do grupo de fazendeiros e comerciantes do município em que eles tratavam de financiar matadores, reunindo provas da participação do fazendeiro na morte de encomenda do sindicalista.
Após periciar e degravar o conteúdo das fitas, o delegado requereu a prisão do fazendeiro, deferida pelo juiz da Comarca. Após 13 dias, o fazendeiro obteve liberdade por decisão em instância superior.
O pistoleiro Welington Jesus da Silva foi preso em flagrante pela Policia Civil ao cair em buraco de obra pública, ficando embaixo do corpo da vítima; ao tentar escapar, foi imobilizado com ajuda de vizinhos que correram até o local, atraídos pelo barulho dos três tiros deflagrados.
Os demais depoentes ouvidos pela promotoria foram a viúva da vítima, Maria Joel. Ela relatou o que ouviu de Dezinho sobre as ameaças por parte de fazendeiros devido ao apoio do sindicalista à ocupação na fazenda Tulipa Negra. Ao falar sobre as emaças à mulher, Dezinho citou o nome de Delsão. Outro depoente, Francisco Martins Filho, que trabalhou para o réu, revelou como conseguiu as fitas K7, após o irmão ser assassinado numa localidade no Estado do Maranhão. Com rosto coberto por capuz por temer represálias, o depoente disse que a Polícia nunca investigou as circunstâncias da morte de seu irmão, tido como pistoleiro do fazendeiro. Para ele, o irmão morreu por saber demais.
Em defesa do fazendeiro depôs Cláudio Marinho, ex-policial militar e ex-vereador de Rondon do Pará, que relatou como ocorreu a prisão do pistoleiro, com a arma do crime, e que o nome do fazendeiro não foi mencionado pelo pistoleiro, na ocasião.
Último a depor, o fazendeiro Alberto Nogueira e amigo do acusado prestou declarações para elogiar o réu, afirmando ser pessoa tranquila e amiga, que vivia para o trabalho e sua família, enquanto tinha conhecimento que a vítima seria pessoa que costumava invadir terras produtivas e causar prejuízos aos fazendeiros da região.
Em interrogatório, o acusado negou participação no crime e que nunca participou de grupo de fazendeiros. Ele também negou conflito com o sindicalista e disse que não o conhecia. Alegou que não teria motivos para matar, pois vivia exclusivamente para seu trabalho “dia e noite” e que nunca teve terras invadidas por agricultores “Sem Terra”, possuindo quatro fazendas de agricultura e pecuária, além de duas serrarias, uma delas, a maior da região.
O processo
O crime ocorreu por volta das 19h, do dia 21/11/2000, em Rondon do Pará, tendo o júri sido desaforado para Belém e distribuído eletronicamente para a 2ª. Vara do Júri da Capital.
Este é o terceiro júri do fazendeiro, que chegou a ser condenado, em 2014, a 12 anos de prisão, mas houve recurso e o Tribunal anulado o júri. Em novo julgamento, ocorrido em 31/10/2018, o promotor de justiça José Maria Gomes dos Santos, designado para atuar no júri, se retirou do júri por não concordar com leitura dos depoimentos de testemunha ausente no seu tempo do debate de uma hora e meia. Segundo o promotor, isso inviabilizaria sua manifestação. Para ele, o depoimento deveria ter sido lido antes, por serem longos.
Consta da acusação que foi formado um grupo de fazendeiros interessados em eliminar o sindicalista que incentivava ocupações de assentamentos em áreas consideradas da união e que estariam sendo griladas por fazendeiros que possuíam títulos falsos.